Honda Civic preparado para ser Pace Car na F-indy 300
A Honda brasileira é quem fornece o pace car para a prova de Fórmula Indy em São Paulo, a Indy 300. Aliás, dois, em que um fica de reserva para o caso de qualquer problema com o que está em uso, como avaria mecânica ou acidente.
São dois Civic LXL 2013 que, como se sabe, tem motor de 1,8 litro e, evidentemente, para esse tipo de uso, os dois têm o câmbio manual de cinco marchas. A Honda convidou a imprensa a conhecer e dirigir seu pace car na pista da Fazenda Capuava, próximo a Indaiatuba, no interior de São Paulo. Não é preciso dizer que foi uma experiência muito interessante. O Arnaldo foi junto.
O Civic pace car, por Bob Sharp
O carro é preparado para uso em pista, para "puxar" o grupo de carros de corrida quando é necessário intervir, normalmente quando há acidente, acho que todos conhecem essa operação nas provas de F-Indy e outras categorias de automobilismo (na F-1 é chamado de Safety Car).
Só que o carro precisa ter capacidade de rodar rápido, ou os motores dos carrros de corrida podem superaquecer, uma vez que não têm ventilador de radiador, dependem exclusicamente do ar dinâmico. Por isso, segundo a Honda, a organização da F-Indy determina que os pace cars devem ter motor de pelo menos 200 cv. A Honda, evidentemente, tratou de cuidar disso nestes Civic.
Duas firmas de preparação foram incumbidas da preparação dos Civic, a Way Motor Sport (www.waymotorsport.com.br), de Maurício Mastroiani, que cuidou do motor, e a Suspentécnica (www.suspentecnica.com.br), de Alberto Trivellato, que efetuou mudanças no chassi. Ambos são profissionais são bastante conhecidos no meio. Claro, aplicaram seus adesivos nos dois Civic pace car, com mostra a foto ao lado.
A única modificação no trem de força foi a instalação de um turbocompressor.BorgWarner, com pressão de superalimentação de 0,35 bar, lembrando que esta pressão é sobre a pressão atmosférica normal de 1 bar. A potência resultante é de 270 cv com torque de 33 m·kgf a 3.700 rpm, mantendo-se nesse patamar até à rotação de potência máxima.
Em nome da simplficação e também devido ao combustível ser etanol, que esfria bastante a carga de ar e combustível ao se vaporizar, bem mais que a gasolina, não foi utilizado interresfriador, aliado ao fato de pace cars terem tempo de ação relativamente curto.
foi utilizado um Turbocompressor no motor 1,8-litro do Civic normal que gerava 140cv e passou para 270 cv
As maiores modificações foram mesmo no chassi. As molas são H&R com constante 20% maior que a especificação original e de menor altura livre para altura de rodagem 40 mm menor que no Civic LXL de série. O carro é pregado no chão, um visual bem diferente do que estamos habituados a ver no Civic nacional de série.
Os amortecedores traseiros são do Civic Si, enquanto os dianteiros são os normais do LXL. Veio também do Si a barra estabilizadora traseira, enquanto a dianteira é original, porém endurecida mediante tratamento térmico. Semi-árvores e juntas homocinéticas são de série, com também o transeixo de cinco marchas. Mas não tinha o diferencial autobloqueante tipo Torsen do Civic Si e deu para sentir sua ausência na pista da Capuava, com falaremos adiante.
Para ajuste do câmber, inexistente no Civic de série (esse ajuste praticamente não existe mais nos carros atuais), foi instalado na manga de eixo um kit para possibilitar esse ajuste.
Os freios contam com discos maiores (300 mm de diâmetro) de aço-carbono na dianteira, com pastilhas especiais de composto cerâmico, e no lugar dos faróis de neblina estão as tomadas de ar para os dutos de arrefecimento dos freios; os freios traseiros são normais do Si. Para evitar qualquer possibilidade de dilatação dos flexíveis de freio, foram usadas mangueiras Aeroquip, que têm capa de malha de aço trançada. O fluido de freio usado é DOT-4, com ponto de ebulição de 600 °F (315 °C).
Os pneus são Pirelli P7 de mesmas dimensões do Civic Si, 215/45R17V e a carroceria recebeu anexos aerodinâmicos – defletores dianteiro e traseiro, aerofólio traseiro e minissaias – todos acessórios originais da linha Access, da própria Honda, de montagem nas concessionárias. São Access também as sapatas de pedais de alumínio com tachinhas de borracha antiderrapantes.
Ao entrar e sentar no banco Sparco, atar o cinto de quatro pontos de mesma marca e olhar os pedais, nota-se logo que são as únicas diferenças em relação ao Civic de série. Há apenas, no console, dois interruptores das luzes giratórias do teto que todo pace car precisa ter.
Ao dar partida, o som grave do motor, típico dos turbos, associa-se à serenidade da marcha-lenta inferior a 1.000 rpm. Mas é só arrancar para ver o que anda este pace car.
O motor é exuberante em potência, seu rugir empolga. Não é preciso exceder 6.000 rpm para seguir estilingando após cada curva através das marchas..Acelera rápido, a ponto de se ficar pouco tempo em cada marcha, mesmo com o escalonamento aberto do câmbio de série. Gostaria de medir uma aceleração 0-100 km/h, mas arrisco dizer ser em algo abaixo de 7 segundos.
Os comandos do motorista/piloto parecem ter sido feitos para se andar em pista, como a direção bem rápida, de relação 13,7:1, e o jeitoso volante de 355 mm de diâmetro. A carga do volante é que poderia ser maior, é leve demais em velocidade. Os pedais permitem punta-tacco fácil e o conta-giros bem diante dos olhos, no centro, proporcionado pelo arranjo do painel em dois níveis, é bem-vindo.
A aproximação das curvas com os potentes freios, as entradas e a atitude ao contorná-las, são corretas. A inclinação da carroceria é mínima e o subesterço é discreto. O que incomoda é a patinagem da roda interna ao dar potência de saída de curva, o que não haveria se tivesse sido aplicado o diferencial tipo Torsen do Civic Si.
A justificativa da Honda para não tê-lo no pace car é que, apesar de precisar ser um carro rápido na sua tarefa, a falta de bloqueio do diferencial não chega a comprometer no trabalho de pace car, um raciocínio correto. O carro não é para corrida, em que, aí sim, nunca poderia prescindir do recurso para favorecer a tração.
Feliz quem pilotou este pace car na corrida do dia 29 de abril...
Bob Sharp
O Civic pace car, por Arnaldo Keller
Na pista, qualquer carro é divertido, apesar de que, na pista, todo carro parecer menos potente do que é. É preciso que o carro tenha um desempenho muito forte para nos impressionarmos e sentirmos aquele friozinho na barriga. Numa pista travada como a da Fazenda Capuava, interior de São Paulo, onde só há curvas de baixa a coisa não tem tanta graça.– a única boa realmente, de média, estava precedida de um chicana apertada armada com cones para evitar problemas com os menos experientes.. Não se sente aquela sensação de desafio, de estar no fio da navalha.
A pista é legal, tem uma seqüência de curvas num sobe e desce, chamada de Saca-Rolha (copiada do autódromo de Laguna Seca, nos EUA), que é bem desafiante, mas, bom... tudo bem, estou bancando o chato, reclamando de barriga cheia, o que é feio fazer. A reta é curta, mal se põe a quarta marcha e já está na hora de frear. Bom... tudo bem. Ela, com o shift-kart (kart com câmbio), deve ser o bicho.
O Honda Civic, reputo o carro de linha nacional, atual, mais gostoso de guiar, por ter o comportamento que mais me agrada. Ele entra nas curvas com pequena tendência de sair de frente, que logo se corrige, e ele passa a escorregar com as quatro. Bem equilibrado, bem previsível, bem suave.
Muito desse correto comportamento vem de controles eletrônicos, que, em caso de perda de aderência, freiam na dose certa as rodas que devem ser freadas, corrigindo tendências e equilibrando o carro. Além disso, em caso de derrapagem, a direção fica pesada se a virarmos para o lado errado da manobra correta a ser feita e leve se a virarmos para o lado certo.
Para esse tipo de teste é bem bom estar na segurança de um autódromo como o da Capuava, que tem amplas áreas gramadas de escape. A Honda, já que desejava nos mostrar justamente essa qualidade do Civic, faz bem em nos apresentar o carro lá.
Esse controle eletrônico vem para ajudar um carro que mesmo sem ele já é muito bom de chão, pois sua suspensão é muito bem acertada, principalmente por ter boa suspensão traseira multibraço, um esmero que a maioria de seus concorrentes abandonou em troca do inferior eixo de torção. Bom freio, bem alinhado em freadas fortes. E confiável. Mandando a bota na pista sem ter dó do freio, em nenhum momento acusou fading nem pedal baixando, tampouco odor caracaterístico de aquecimento excessivo.
A Honda levou Civics normais para se dirigir e comparar
E aí vem um dos melhores atributos, a meu ver, do carro: a excelente ergonomia. Banco macio e com bons apoios no lombar e nas laterais, pedais muito bem posicionados, que nos permitem fazer facilmente o punta-tacco nas reduções, e o mais importante, o volante tem amplo ajuste em altura e distância, então ele, que é o comando prioritário ao nos ajustarmos num carro, pode ficar no lugar exato sem que tenhamos sacrificar a correta distância dos pedais.
O que é de estranhar é a alavanca de câmbio ainda estar mais perto do passageiro do que do motorista. Deveriam, a meu ver, inverter as posições, ou seja, colocar a alavanca do freio de mão à direita e a do câmbio à esquerda, mais perto do volante. Vai entender por que está assim, embora o projeto do carro seja japonês, de um país onde a mão é esquerda e o volante, na direita..
Outra coisa, já bem mais chata, é a tal da caixinha alta de descansa-braço no console (foto abaixo, seta) a nos atrapalhar o cotovelo nas cambiadas. É mais um carro com esse defeito miserável (Fiat Bravo, Hyundai i30, Renault Fluence, Omega nacional, só para citar alguns de estalo) que vem de projetá-los para o câmbio automático, onde essa caixinha chata não incomoda, já que não se muda marcha, e deixar o carro do mesmo jeito para a versão de câmbio manual. Não custava nada cuidar desse detalhe, que para mim não é detalhe. O carro é bom e merece.
Descansa-braço atrapalha quando o câmbio é manual
E daí, após andar devagar e também rápido no Civic normal, câmbio manual, fui me divertir um pouco no Civic pace car da Indy 300. Sua suspensão foi muito bem projetada e acertada, o comportamento é ótimo e ela não é nada essencialmente pista, e pode ir pra rua sem problemas. Bom trabalho.
A pegada do turbo começa a vir a 3.200 rpm, e a 3.700 rpm ele pega pra valer. Anda forte e é progressivo, nada estúpido, uma preparação que pode perfeitamente ser usada para uso na rua, e de preferência uma boa estrada. Sua potência máxima vem do aumento do torque, já que foi mantida a mesma rotação para o corte, 7.000 rpm.
A pressão não é exagerada e o moderno motor soube agradecê-la com muita resposta em potência. Pena que a pista travada não dê muito espaço para usarmos de verdade essa cavalaria toda de 270 cv. O fato do carro não ter o diferencial tipo Torsen do Civic Si – o que seria moleza para a Honda colocar –, o deixa com pouca tração para que aproveitemos a contento a potência disponível, principalmente nas saídas de curva, onde ele patina se despejarmos um pouco mais de potência.
Portanto, chego a dizer que um Civic Si – que testei ao longo de uma semana e conheço bem, mas que infelizmente a Honda tirou de produção no Brasil em 2010 –, mesmo tendo 78 cv a menos que o pace car (192 cv), lhe daria um belo suador nessa pista da Capuava, já que com ele, nas saídas de curva, nós poderíamos despejar uma potência maior do que o pace car aceita.
Em Interlagos, com retas mais longas, não; o pace car o despacharia longe. O que acabo de dizer não é novidade para o competente pessoal da Honda. Eles fizeram um carro para o necessário e boa. Se valeram para isso de preparadores independentes, já conhecidos pelo meio, e competentes, pois um projeto feito pelo pessoal oficial da fábrica demandaria burocracia, tempo etc, em excesso. Afinal, são só dois carros.
De qualquer modo, lamento, como na certa os engenheiros da Honda também lamentam, que no Brasil não haja um campeonato de marcas verdadeiro, marca contra marca, onde esses engenheiros apaixonados e conhecedores possam colocar em prática tudo o que sabem. Eles estão que nem o Civic pace car; têm potência de sobra.